Estudos destacam o papel das brincadeiras no desenvolvimento das crianças; educadora defende que o lúdico deve ocupar lugar central no currículo escolar

Brincar não é só um direito da infância reconhecido pela Unesco, mas também um fator essencial no desenvolvimento e na aprendizagem infantil. É o que aponta o guia “Aprendizagem por meio da Brincadeira”, divulgado pelo UNICEF em parceria com a Fundação LEGO. Segundo a entidade, uma em cada cinco crianças com idades entre 2 e 4 anos não brinca com os seus cuidadores em casa.
Além disso, o estudo defende que a brincadeira seja incorporada de forma sistemática nas políticas educacionais, nas práticas pedagógicas e no engajamento das famílias. Entendimento que vai ao encontro de um artigo publicado pela Harvard Graduate School of Education, mostrando que escolas que adotam práticas pedagógicas baseadas no brincar apresentam maior engajamento dos alunos e menor índice de evasão escolar.
Na Casa Escola, instituição que adota uma abordagem construtivista, o brincar faz parte do currículo de forma planejada e intencional. “A infância é o tempo da experimentação. Quando a criança brinca, ela cria hipóteses, testa limites e constrói sentidos sobre o mundo ao seu redor”, afirma a diretora Priscila Griner. “Por isso, o lúdico precisa ser reconhecido como estratégia pedagógica, não como um tempo ocioso entre conteúdos formais.”
Para a educadora, é preciso também ampliar a compreensão de que o brincar não se limita à Educação Infantil. “Muitas escolas ainda enxergam as brincadeiras como algo dos anos iniciais. Quando o aluno chega ao Ensino Fundamental, o lúdico desaparece quase por completo da rotina, substituído por um cronograma exaustivo de conteúdos. Isso compromete o prazer de aprender e distancia o aluno da escola”, avalia.
O estudo do UNICEF destaca ainda que a educação dos anos iniciais deve ter um currículo adequado ao desenvolvimento infantil, que priorize experiências lúdicas e centradas nas crianças. Nesse sentido, conforme o documento, deve-se ampliar os critérios de avaliação para incluir habilidades desenvolvidas por meio da brincadeira — como criatividade, colaboração, resolução de problemas e autorregulação.
Nesse sentido ainda, Priscila Griner manifesta preocupação com a proposta da nova matriz curricular da Secretaria Municipal de Educação de Natal, instituída pela Lei nº 241/2024. A iniciativa estabelece a supressão do trabalho dos profissionais de Educação Física e Artes nos anos iniciais do Ensino Fundamental, transferindo suas atribuições e respectivas cargas horárias para o pedagogo.
“Em muitas escolas, a ludicidade fica restrita exatamente a essas áreas, à prática de uma atividade física ou artística, cujos respectivos profissionais recebem formação acadêmica adequada para atuar com profissionalismo e conhecimento. Retirar esses profissionais do processo é reduzir ainda mais os espaços onde o brincar e a expressão corporal e criativa têm vez”, enfatiza Priscila.
De acordo com ela, atividades como contação de histórias, oficinas de arte, manualidades, música e brincadeiras sensoriais e corporais ampliam as formas de expressão e favorecem a aprendizagem em diferentes áreas do conhecimento. “Brincar é coisa séria, é a linguagem da criança. Quando entendemos isso, conseguimos ensinar de forma mais conectada, respeitosa e eficaz. Não é sobre improvisar, mas sobre planejar momentos em que a criança aprende com o corpo, com a imaginação e com as relações”, conclui a diretora da Casa Escola.